terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Criador vai processar o Estado para reaver perdas com a seca

Rio Grande do Norte

A pouca chuva que caiu semana passada não foi suficiente para mudar o cenário no interior do Rio Grande do Norte. Da mesma forma, não alterou a expectativa do sertanejo quanto ao inverno deste ano. Árvores mortas, rebanho definhando, reservatórios secos, cemitérios de animais e produção agrícola zerada. Ao passo que a estiagem deixa marcas de devastação no território potiguar, o homem do campo implora pela ajuda que não chega. As ações emergenciais são tímidas e a previsão metereológica apontando um ano de chuvas irregulares assusta. Em Caicó, o advogado e pecuarista Raimundo Medeiros Filho, vai cobrar na Justiça indeização de R$ 1 milhão, por entender que o Estado foi responsável pela morte de 500 cabeças de gado em sua propriedade. 

Para cobrar ações mais enérgicas e com impacto mais produtivo, a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado (Faern) vai entregar, nos próximos dias, um diagnóstico da atual situação ao Governo do Estado e Assembleia Legislativa. O documento será o extrato de uma visita feita, no último fim de semana, a cinco municípios localizados em três regiões do RN. Técnicos da Faern foram à propriedades em Lajes, Santana do Matos, Apodi, Pau dos Ferros e Caicó. A TRIBUNA DO NORTE acompanhou a visita da "Expedição Retratos da Seca". "O objetivo é mostrar o que o homem do campo está enfrentando e cobrar mais ações. Até agora, tudo está sendo feito de forma tímida enquanto vivemos um apagão na pecuária e agricultura do Estado", frisou o presidente do órgão, José Vieira. 

As perdas geram números preocupantes. A estiagem dura 19 meses e 30% do rebanho já foi dizimado. Na lavoura, a secretaria de Estado da Agricultura, Pecuária e Pesca (Sape) estima uma queda de 70% na produção. São quase 500 mil pessoas afetadas diretamente. No campo, os números são traduzidos no sofrimento dos produtores. Nesses tempos de estiagem, o verbo "perder" faz parte da rotina dos sertanejos. Conta-se o que já foi levado pela seca, o que está morrendo e o que ainda pode ser extinto.

Em Apodi, a 328 quilômetros de Natal, Francisco Sobrinho de Souza, 57 anos, produzia mel, castanha de caju, leite e laticínios. Há três anos, chegou a colher 18 toneladas de castanha. Este ano, foram apenas 150kg colhidos. Os cajueiros estão secos. Não há folhagem. A produção de mel foi a zero. Sem flores, as abelhas vão embora. As colméias onde o mel era produzido estão jogadas em um canto. No curral da fazenda, mais perdas. "Perdi mais de 50 cabeças de gado e pelo jeito vai morrer mais bicho", informou.

De acordo com o produtor, o Programa do Volumoso, do Governo do Estado, não chegou à sua propriedade. Já a entrega de milho, feito pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), não funciona a contento. "É muito limitado. Recebi 45kg em janeiro e agora, em fevereiro, não recebi nada", disse em tom de desabafo.

A seca não reduz apenas a produção. Agropecuaristas e produtores de leite dizem que a mão de obra está escassa. Na Fazenda Tupá, localizada no município de Santana do Matos, distante 191 quilômetros de Natal, há vagas de emprego. Antônio Arruda da Cunha, proprietário do local, oferece a diária de R$ 50,00 para o trabalho de cortar e queimar xique-xique. O vegetal espinhoso serve de alimento para o gado após o processo de queima. "Mas falta gente para trabalhar. O pessoal não quer", disse Antônio. "Já cheguei a contratar 30 homens de uma vez, hoje, não tem ninguém", completou.

Antônio da Volta, como é conhecido o produtor, acredita que a falta de trabalhadores deve-se aos programas sociais financiados pelo Governo Federal. Bolsa Família e Salário Maternidade, pejorativamente chamado de "Bolsa Bucho", são citados. O lacticultor pontua outras baixas na fazenda. A propriedade de quase 1.200 hectares chegou a ter três mil cabeças de gado e mais 1.500 cabeças de ovinos e caprinos. Hoje, os rebanhos não chegam à metade desses números. Parte morreu, parte foi vendida. Atualmente, a produção de leite é de seis mil litros por dia. Dois mil litros a menos que o habitual.

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